Criança anterior e interior

Essa semana revi um vídeo caseiro feito pelo meu pai anos atrás. O roteiro consiste nele filmando a rotina de nossa família, numa performance que combina muito zoom, bom humor e dedicação. Vários aspectos do vídeo me mobilizaram, mas sem sombra de dúvida o que mais me comoveu foi poder me observar enquanto criança.

Surpreendi-me com estranha familiaridade frente a uma bebê expressiva, brincante, e desde cedo defensora de sua mãe. Uma que não tinha ideia do que a vida lhe apresentaria, mas que tampouco precisava ter. A fluidez de seu corpinho entre brincadeiras ilustra que nada poderia ser mais importante que o puro brincar, e meu coração se aqueceu pela oportunidade de uma infância assim.

Enxerguei na garotinha do vídeo pistas de um caminho comum de investigação do mundo. Uma determinação (às vezes birrenta) em realizar certos desejos. A mesma capacidade de imersão no mundo da fantasia. A falta de foco, dispersa num brincar criativo e no constante cuidado pra manutenção de um ambiente amoroso.

Fiquei olhando praquela que na tela parece outra, me reapropriando de cada gesto que ainda é meu. E nesse exercício me perguntei quanto dela está dentro de mim, adormecido. Quanto de mim hoje, já estava presente naquela menininha rechonchuda. Quais defesas ela ativava quando se sentia ameaçada. Que sonhos germinavam naquela cabecinha, que cabe a ninguém menos do que eu mesma tentar realizar?

Pra quem me conhece, sabe que eu e minha mini-eu não somos tão fãs de respostas. Mas ainda hoje temos perguntas de sobra.

A criança sempre diz o mundo inteiro no olhar.

Em seu reflexo há caminhos, mas o que se pode encontrar?

Garantias, não teremos. Dinheiro, prestígio, conquistas…

O que a infância guarda é mais profundo! Que, como tesouro, com sorte fica de herança a quem saiba resgatar.

 

Larissa Castro Alves

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